Os franceses. França é assim aquele país onde só se ouve falar de França. Nunca me senti num país tão fechado e tão pouco interessado no que se passa no resto do mundo. Mesmo as pessoas são muito menos receptivas a novas ideias e novas culturas do que a sociedade portuguesa. A burocracia é enorme e as politiquices organizacionais estão francamente enraizadas. Os franceses falam pouco comigo! Ficamos pelo bonjour, ça va, salut e mais umas quantas frases de trabalho. O diálogo de como vai a vidinha obriga-me a mudar para inglês. E nesse momento é quando se faz silêncio do outro lado. Compreende-se. Os tipos vêm os filmes dobrados no cinema. Acham que não faz sentido existirem legendas. E depois ainda discutem o desempenho da Angelina Jolie dobrada pela não sei quantas. E se eu lhes falar em cinema francês (que de resto é dos que mais gosto), olham para mim como se fosse imbecil. Eles gostam mesmo é dos filmes de Hollywood em sotaque napoleónico! Deve ser preciso ser francês para compreender! Bem, pelo menos este contexto obriga-me a aprender a falar francês. Mas nem sempre ajuda, porque há situações em que o melhor mesmo é eu não participar nas conversas. Um destes dias estava a almoçar com colegas do laboratório. Falavam de casamentos e de festas de família (assunto frequente, diga-se). Eu fiz apenas um comentário. “Agora só os meus amigos homossexuais é que casam!” Fez-se um silêncio que me congelou. Uma das pessoas na mesa ainda disse “Pardon? Ça c´est bizarre!” E continuaram a falar sobre o assunto. Como se um casamento homossexual fosse qualquer coisa do outro mundo, descoberta algures depois de vestígios de água em Marte e antes de vulcanismo em Úrano. O meu francês não deu para dissertar sobre o assunto. Infelizmente!
Os gabinetes. Os gabinetes lá pelo instituto são dignos de registo aqui no blog. Todos. Mas mesmo todos. E são muitos… Estão personalizados! Fotocópias coloridas de animais na paredes. E é vê-los… golfinhos, coalas, girafas, iguanas, macacos (do guaxinim ao chimpanzé), elefantes,… As fotografia do filho, do amigo do filho, da neta, da mãe, do maridinho, dos dois envolvidos num coração, os amigos, o cãozinho dele, o cãozinho dela… as frases do Dalai Lama,… E há também aqueles que transformam o gabinete na agência de viagens. Assim… do tecto ao chão. As praias do Índico ou das Caraíbas, as paisagens naturais, as cidades à noite,… se há coisa que percebemos é que os franceses gostam de animais e de ambientes naturais! Mas curioso… Não vi uma única fotografia de pessoas de outras culturas! Porque será?
A televisão. A RTP e SIC internacionais fazem com que me sinta um pouco mais próxima de Portugal. Poder ver o telejornal justifica os 5€ que pago pelo “bouquet lusophonia”. Chegam as notícias de um país “voltado ao contrário” nas comemorações do 5 de Outubro. Todos os dias há manifestações de pessoas desempregadas ou despedimentos colectivos. Hoje foi no meu jornal de eleição: o Público. As más previsões do FMI demonstram que Portugal não tem sido mais do que um laboratório de aplicação de algumas fórmulas que uns e outros andaram a teorizar na secretaria do gabinete. Mas meus senhores! É de pessoas que se trata! De pessoas que representam famílias! De famílias que representam a sustentabilidade de uma nação que tem mais de 800 anos de história na Europa. E muitos, como eu, sentimos o coração a palpitar na cabeça. Que será de Portugal? Que será de nós? Que será de mim? Que será dos meus? Que será da minha filha?…
Sempre pensei que nós portugueses fossemos dos mais preconceituosos… pelos vistos há países mais desenvolvidos, em algumas áreas mais retardados 🙂
Nunca percebi o porquê de tanto problema… cada qual na sua… cada qual faz a sua cena. Podemos até não compreender, mas devemos aceitar… Isto não só em relação à homossexualidade… mas em tudo, seja religião, clubes de futebol, raças, etc.
Em relação ao nosso Portugal economicamente… é o que se vê… cada vez pior. Nos antepassados, quando um castelo era tomado, a bandeira era içada ao contrário… propositado ou não no dia 5 de Outubro mostrou-se uma grande realidade infelizmente.
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Quando eu digo que Portugal evoluiu muito em relação à discriminação das minorias, alguns amigos dizem-me que não é Portugal, é Lisboa. E depende do meio de que estamos a falar. Eu gosto de pessoas e gosto de diversidade. Tenho desde o amigo(a) certinho(a) da linha cujo objectivo é fazer uma carreira, ao freelancer que faz a barba uma vez por mês ou ao ocupa que se recusa a pagar impostos ou a ter um emprego durante todos os dias da semana. A orientação sexual nada tem a ver com o segmento social ou estilo de vida. Faz parte da intimidade de cada um. E como uma pessoa amiga me dizia ha algum tempo “Não é algo que eu possa mudar e demorei muito tempo a perceber que eu (só) conseguia amar pessoas do mesmo sexo que eu. Só quando aceitei isso é que consegui sentir-me livre e feliz!”. Obrigada pela presença assídua no agora digo eu.
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A adaptação é sempre complicada e os franceses, na sua maioria, são pessoas demasiado rigidas e muito pouco tolerantes; recuando no tempo e observando um brutal regime colonialista percebe-se bem isso. Quanto ao futuro de Portugal é melhor nem pensar nisso, como dizia alguém: “there’s no future” 😦
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A ultima expressão deixou-me sem reacção. Porque tentei escrever “claro que há futuro”, o que ingenuamente acredito. Mas depois comecei a pensar na situação. Comparei o país a uma família que se endivida mais do que pode. A certa altura os salários da família não conseguem pagar os juros, quanto mais a dívida. Deixam de pagar os créditos e há uma insolvência familiar. Mas numa escala país – não pode haver insolvência de um país. Há quem fale de um retrocesso, o regresso ao Portugal dos anos 60. Mas tudo mudou e a generalidade das empresas que ainda persistem dependem da competitividade dos mercados. A energia em Portugal está estupidamente cara quando comparada com os competidores directos. A EDP, por exemplo, que está internacionalizada e creio que uma fatia considerável da sua receita é internacional, poderia fomentar o crescimento de Portugal, pela criação de um perfil patriótico com redução do preço da energia em Portugal. Outros exemplos existirão, mas o que sei é que para que exista futuro terá de ser o sector privado a dinamizar a economia portuguesa. Obrigada pela presença assídua no agora digo eu.
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Excelente observação e descrição. Os franceses, povo do centro da Europa, nunca sentiram o chamamento do Mundo como os periféricos. Por isso serem chauvinistas.
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Obrigada Carlos. Mas são também um povo muito crítico e os políticos por aqui ou andam direitinhos sem grandes manobras de diversão ou há problema! Os franceses têm um sentido de propriedade em relação ao seu país e uma predilecção por tudo o que é francês. beijinhos.
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Olá. Tenho lido os seus artigos que considero interessantes. Obrigada por dar a conhecer a sua experiência de vida em França. A adaptação nunca é fácil em país algum. Escreve lindamente. Parabéns.
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Muito obrigada. Viver num país diferente é também, mais do que valorizar o nosso país – que para mim sempre teve muito valor – um desafio pessoal e, em certa medida, um auto-teste de que é possível fazer bem, no matter what! É bom reencontrar pessoas e delas ter o feedback do que escrevo. O Bruno continua de cabelo curto :)! Obrigada
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Sim, continua de cabelo bem curtinho. Está no 2º ano do curso de turismo em Dublin. Adaptou-se bem à Irlanda, apesar do clima frio e chuvoso.
Boa sorte para si.
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Eu não sei onde é que isto vai parar, não sei não…
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Pois… eu também não :-(!
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Sou francês. Estudei a lingua portuguesa (tenho “diplome superieur de langue lusophone de la faculté d’Aix-en-Provence). Fiz varias viagens a Portugal e morei vinte anos no Rio de Janeiro. Quer dizer que sei o que é frequentar uma cultura diferente da sua e viver em terra estrangeira. O julgamente que Agoradigoeu fez dos Franceses não é totalmente errado mas sempre desconfio das pessoas que julgam um povo atravês dos moradores da capital do pais. A França não é Paris e os Franceses têm pouco a ver com os parisienses. Da mesma maneira, Portugal não é Lisboa, Brasil não é O Rio, Italia não Roma nem Milano. No que se refere à opinião sobre a atitude dos “franceses” em relação ao casamento dos homosexuais, tudo depende do meio social e cultural que você pode encontrar. É ridiculo falar como você fez da opinião dos franceses quando se sabe que mais de 60 % do povo fica a favor do casamento. Em conclusão: Gostei de falar com você e mando um abração.
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