Nice vive, por estes dias, a ressaca do verão.
As ruas não têm mais a euforia das saias curtas e saltos agulha das miúdas (e menos miúdas) inglesas (ou não), o botox das mamis channel ou os Ferrari mal estacionados na Promenade. O frenesim de quem desce ao Sul por 7 dias de euforia, onde tudo se permite… Tudo é mais lento, porque quem fica, fica com tempo. Para nós, aqueles que têm a côte d’Azur como morada de todos os dias, é como voltar a ganhar o espaço (e o tempo) que durante o verão nos foi invadido.
Doce. Há alguns dias disseram-me que esta é uma região doce para se viver. É um adjectivo interessante, este… Pode ser vivida de formas diferentes e também é verdade que há vidas que nunca se cruzam. França não é um país diferente dos outros (ou pelo menos de Portugal) no que diz respeito às suas comunidades. Quantos de vós, que nunca viveram fora do vosso país, têm amigos estrangeiros? Quantos de vós, que habitam no estrangeiro, se relacionam socialmente com nativos? E existem ainda os outros… Aqueles que, tendo nascido no país em que vivem, portam nos seus genes (e educação) uma identidade mestiça que os torna – à nascença – filhos de parte alguma, que é também sinónimo de filhos do mundo ou dos novos tempos. O interessante aqui é que as comunidades são expressivas, algumas delas impõem mesmo as suas regras. Hoje, se pensar em França, não esqueço os talhos de carne halal (local em que os muçulmanos compram a sua carne), as datas do ramadão ou os cabelos cobertos que se passeiam na Promenade. Curiosamente sinto-os mais proprietários de França do que aos franceses genuínos – esses sinto-os resignados a uma invasão (numérica e cultural) com a qual dificilmente se relacionam. França é um país fragmentado. Verdadeiramente!
Ontem foi noite de concerto. Um concerto a 2 fases, uma israelita e uma cabo-verdiana. Ambas cresceram em França. Ambas cantaram (também, mas não só) em Francês. Naquele concerto esteve representada esta França do séc XXI. Aos ritmos do norte de África e Médio- Oriente juntaram-se os ritmos da nossa África – a de Cabo Verde! Cantou-se em Portugues crioulo e a verdade é que me senti em casa!
A música, nas suas sonoridades do mundo, são o pulsar destes novos tempos – e é, talvez, juntamente com a gastronomia, o espaço em que uns e outros partilham interesses!
Voltemos à Nice doce. À Nice de todos. Dos ricos e dos pobres. Dos pretos e dos brancos. Dos crentes no corão e dos crentes na bíblia. Dos não crentes em coisa alguma (se for possível). Para todos existe uma garantia. Se ontem o sol se escondeu. Hoje voltou a nascer. Curiosamente, ontem e hoje, presenciei ambos os momentos, naquele que é o meu local preferido da cidade: a Promenade. Deixo-vos o registo – e sim… Esta é a minha côte d’azur…
Até breve…