“Ontem o meu colega ficou a saber que não lhe vão renovar o contrato. O patrão diz que ele não atingiu os objectivos. Objectivos de merda. Que ninguém consegue atingir. Dois anos para nada. O patrão diz que ele poderia ter avançado os projectos durante o fim-de-semana. Afinal até tem portátil da empresa. Agora só resto eu e quase vinte secretárias vazias. Não sei até quando. Um gajo trabalho até tarde. Trabalha ao fim-de-semana. Estamos em crise – é justificação para tudo. E em vez de melhorar só piora…”
Por terras napoleónicas todos pensam que Portugal está muito melhor do que em 2012. Acham que a intervenção da troika foi positiva para o País. Que o ajudou a separar o trigo do joio. E que agora Portugal se tornou um país de esperança e oportunidades. É isso que ouvem nas informações. E os políticos portugueses são mesmo considerados um exemplo de tenacidade face às adversidades. No avião tenho conhecido muitos turistas franceses que visitam Lisboa. E sem excepção fazem-me sempre as mesmas observações. “Não percebemos como é que um país que tem dificuldades financeiras tem tantos bancos. Parece que não existe mais nada. Numa rua podem existir cinco ou seis bancos. E às vezes até existem duas agências do mesmo banco. Aquela avenida grande, por exemplo. A do Marquês de Pombal. É só publicidade de bancos. E parece que os edifícios só estão cuidados e iluminados quando se trata de um banco.” Só tomei consciência disto depois de viver em França. Aqui é completamente diferente. Os bancos escasseiam e há mesmo vilas em que só existe um multibanco. Portugal não parece ser mais do que um quintal de interesses à sua escala. Neste ambiente de medo – como o testemunho com que iniciei este post e que ouvi de uma pessoa próxima.
Ser emigrante faz-nos mudar o olhar sobre as coisas. Somos, de alguma forma, espectadores. E é neste papel que vejo um polvo que se chama Alemanha personificado numa Angela Merkel, que tem uma ideia de Europa cujo centro é o seu país. Uma Alemanha que se relaciona com a França na hipocrisia que a última lhe ensinou, que aprendeu a controlar a sua arrogância para com os vizinhos, até porque está na mó de cima e os franceses estão ocupados com as alocações sociais e direitos dos trabalhadores. E a Alemanha sabe que a Grécia não está sozinha. Não ficará sozinha. E vai ceder. Os Estados Unidos têm interesse naquele canto do mediterrâneo. Até porque não acredito que o eixo Rússia / Ucrânia tenha já findado todos os actos da sua peça. A juntar a esta conjectura geo-política temos esse fantasma que se chama terrorismo, na personificação dum movimento jihadista – leia-se, na acção de pessoas como nós, que foram, porventura, manipuladas por ideais de poder, camuflados em religião.
Portugal continua igual a si próprio. A comportar-se como bom aluno para receber palmadinhas nas costas. Mesmo que o custo tenha sido o êxodo, sem precedentes, de pessoas diplomadas, a perda da esperança e o comprometimento da natalidade. Afinal Salazar até tinha razão. Basta ter a instrução primária. Pessoas com sentido crítico são um empecilho à governação! Recebemos do Estado Novo a “vocação”para cumprir ordens, sem protestar. Às vezes penso que o 25 de Abril não foi uma revolução ganha pelo povo “que mais ordena”, mas sim um sistema ditatorial, há muito moribundo, que perdeu.
E era isto.
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