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Quando a conversa é sobre eles…

Sabem aquelas amizades de infância?

Aquelas amigas da primária. Com quem compararam o número do soutien. Conversaram sobre os primeiros namoricos. Ouviram as primeiras músicas – “os new kids on the block” :). Os jogos bate-pé ou quarto escuro. As dicas nos testes. As primeiras saídas…

Pois bem… Ontem, enquanto estávamos em amena cavaqueira no Facetime, reparámos que estamos a chegar a uma nova idade. Ai os 40 aí tão perto!

“-Amiga, aos 20 apresentamos o moço dizendo em que Faculdade anda, que música é que gosta de ouvir, que bares é que frequenta! aos 30 dizemos o que é que faz, se mora sozinho e se é de confiança. Agora é quantos filhos tem, a idade, há quanto tempo se separou, deixou ou foi deixado, está ou não resolvido…”

E quando não é assim! E surge aquele “Ahm!?! não tem filhos nem nunca viveu com ninguém?!” A conclusão é quase imediata: “Amiga esquece! Esse tipo tem problemas!!!”

A bagagem que trazemos faz de nós o que somos! Ainda bem. Significa que vivemos!

Tenho estado a ler um livro fantástico. “Les Perroquets de la place d´Arezzo” de Eric-Emmanuel Schmitt. Deixo-vos com uma frase que me roubou uma gargalhada:

“-Vive les épouses et vive les putes! Ce sont les seules femmes qui se contrôlent”.

(dito por um homem, naturalmente!).

E era isto!

Mas porque é que os homens acham sempre que são mais espertos?

Sabem aquele momento em que recebem uma mensagem de um nome que vos é familiar, com quem não falam frequentemente e que diz:

“Hi Paula, I am sorry, BUT no internet. I m in Denmark, to see rainbow. Bj”

Hum. Parece normal, certo? Mas não! Eu traduzo:

“Hi Paula” – é a primeira vez que me trata pelo meu nome, normalmente prefere adjectivos.

“I am sorry, BUT no internet” – mas esta a desculpar-se de quê? eu nem o tentei contactar!

“I’m in Denmark” – Ah… ok!!! Agora começo a perceber!! Denmark é onde vive a namorada que ele diz ser a ex-namorada. Ok! Portanto, voltando ao principio, o que eu devo ler nesta mensagem é que o moço esta com a namorada, pelo que não pode receber mensagens.

“to see rainbow” – quem muito se justifica… ja a minha avo dizia! Rainbow é o cão! Eu quero la saber por que motivo é que ele foi à Dinamarca!

Mas porque é que os homens acham sempre que são mais espertos?

Sera que não era mais facil suspender as notificações do telefone ou dizer, simplesmente, “não me contactes!”.

E se ele desaparecer? Pois… significa que foste ghosted!

E se ele desaparecer? Bloquear o whatsapp. Ficar invísivel no facebook. Vedar o acesso à conta telefónica. Fizer unmatch na aplicação online. Se ele desaparecer significa que tu foste “ghosted” e aquele que pensaste ser o teu “qualquer-designação-que-lhe-queiras-atribuir” passou a ser um ghost.

Quando utilizei a aplicação Tinder (ler aqui ou aqui), comentei com algumas pessoas próximas que o mecanismo de selecção me fazia sentir uma péssima pessoa. A ideia de eliminar pessoas em menos de um segundo, fazendo deslizar a sua foto para a esquerda, torna aquela pessoa menos humana e constrange-me a tendência (e rapidez) que eu tive para eliminar perfis. Como se fosse um objecto  que deitamos ao lixo. Esta é provavelmente a motivação justificação origem de uma tendência, que ao que parece não é recente (eu desconhecia, mas normalmente sou a última a saber destas modas), nas relações (ditas) amorosas: o Ghosting.

Aqui há uns dias uma amiga enviou-me uma mensagem (relativamente a uma pessoa que conheceu online): “- Mandou-me uma mensagem de manhã toda doce para a seguir me bloquear o whatsapp. Pelo menos é o que me parece. Eu já não consigo ver a foto dele. Bloqueou-me.”

Eu, na minha ignorância respondi-lhe: “- Não percebo. Será que não é simplesmente porque não tem rede ou assim… Talvez estejas a fazer um filme!”

Ele desapareceu. Mesmo. Assim como apareceu. Ele que para lhe roubar um beijo fez 80 Km. Ele que jurou amor. Ele que fez planos. Ele que a fez acreditar estar a viver um momento único. Um match perfeito. Desapareceu. Assim… Como apareceu. E ela sentiu-se sem chão. Ela sentiu-se humilhada. Ela sentiu-se usada. E Pior. Sem possibilidade de obter uma explicação. Um Fim. Porque todos os inícios merecem um fim.

Tudo me pareceu surreal. E esta situação fez-me relembrar uma conversa com um rapaz no Tinder. Perguntou-me: “tu és daquelas que desaparece?” E eu achei estranho. “Desapareço?”. Na altura eu estava mais interessada em compreender as motivações para utilizar estas aplicações – não dei grande importância ao “despareces” – (até porque nem aparecer ía), mas depois desta situação com a minha amiga decidi pesquisar. Este comportamento tem o nome de Ghosting e vale mesmo a pena ler este artigo aqui.

Esta situação aconteceu poucos dias depois de eu ter publicado o post “Codigos no Tinder”. Numa noite, enquanto tentávamos compreender o modus operandis do ghost, tivemos uma ideia. Um tipo que tem este comportamento, vai ter sempre a mesma estratégia de assédio e o crivo não deve ser muito apertado! Ela fez um novo perfil, desta vez com uma fotografia dos pés calçados numas sandálias de salto alto (isto lembra-vos alguma coisa?), com uma frase enigmática do género “Stay at home if you don´t want to take the risk”. Com este novo perfil conseguiu ter acesso ao perfil do agora ghost. Fizeram match. (How obvious!!). E minutos depois já estava a receber mensagens dele. E torna-se tão vulgar e ridículo e desonesto perceber que as pessoas podem ser tão básicas que nem sequer percebem que caem na sua própria armadilha. E ele. Sem saber. Conta a mesma lenga-lenga àquela que pensa ser a sua próxima ghosted. Ora leiam o nível do discurso (deve ter ficheiro word para fazer copy/paste):

ACheekyGeek Being picky is where I faulter and this is 30 years of choosing the wrong women which helped me shape what i want or not lol

Classy, takes pride in her appearance (nice hair nice nail etc), not afraid to wear skirts and dresses as well as jeans lol, I guess girly girl, funny, intelligent, not scared of spontaneity, knows what she wants, stable, loyal, chemical and emotional attraction has to be there, physical and sexual attraction also, no relationship can last on one or the other alone, now the honest bit… Must enjoy sex! Slow sex, passionate sex, hard sex, rough sex, all sorts, can’t handle women that use it as a tool against men these days, not into playing games physically or emotionally.

A estória ainda não tem um fim. Afinal ele tem gasto o seu tempo a falar com o que pensa ser uma enfermeira – ocupadíssima e com turnos e, sobretudo, com medo de ser reconhecida pelos doentes. Ele está, portanto, a falar com uns sapatos de salto agulha. Não leva a lado nenhum! Mas pelo menos a minha amiga fica com a certeza de que estes merdas – que não tem outro nome – existem e não passam de uns badamecos sem carácter.

A minha amiga vive em Nova Iorque. Estes fenómenos são mais frequentes em vidas cosmopolítas do que em pequenas cidades. Mas é possível que se torne mais comum do que o desejável. E não me venham com merdas. Que afinal era uma cena de internet e que por isso menos pessoal. Que desaparecer evita o confronto, decepções e justificações. Que os silêncios por si só significam a decisão do Fim. E a melhor. Que ao desaparecer não há um Fim efectivo. Há sempre a possibilidade de reaparecer…

Por isso meninas. Alerta!

Uma pessoa escreve…

sobre sites de encontros na Internet e os comentários/questões passam a ser para o meu email em vez de serem públicas aqui no blog…

O que também não deixa de ser curioso é o facto do post ter likes de moças – os moços não gostaram! Aliás, alguns moços escreveram-me ofendidos com os códigos Tinder que publiquei. Dizem que estão seriamente à procura da outra metade – é de louvar!

“Moment d´un couple” de Nelly Alard.

É pena que Nelly Alard não tenha (ainda) os seus livros (“Le crieur de nuit” – 2010 – e “Moment d´un couple” – 2013 -) traduzidos em português.

O meu critério para escolher os livros de autores franceses, é mais ou menos o mesmo que aplico à escolha dos vinhos. Escolho livros premiados. “Moment d´un couple” apresentou-se de capa sugestiva, titulo comum e com a indicação “Prix Interallité 2013”. Livro escolhido. Sem arrependimento. Vou tentar fazer a tradução de algumas passagens, para que possam compreender por que motivo o li num trago.

O romance tem como cenário a cidade de Paris, no ano de 2003. Um casal de trinta e muitos anos. Dois filhos pequenos. Ela engenheira. Ele jornalista.

O livro começa com Olivier, o marido, que telefona a Juliette, sua esposa. É feriado. Ela está com os filhos num parque de Paris.

“Onde estás? – No Buttes – Estás sozinha? – Não, estou com a Flo e com os miúdos. – Podes distanciar-te um pouco, tenho uma coisa para te dizer.

O sorriso de Joliette desapareceu. Faz um sinal a Flo, levanta-se e volta a sentar-se na relva, a dez metros de distância. Do outro lado da linha Olivier parece aflito.

O que é que se passa? pergunta-lhe ela. Antes de ouvir a sua resposta, ela sente uma bola no estômago. A ideia de que Maria estivesse morta.

Bem. Tenho uma estória com uma mulher. É uma eleitora socialista. Dura há três semanas e agora ela quer que eu te deixe. É por isso que te estou a ligar. Disse-lhe que hoje ía ao cinema contigo e ela começou a ter uma crise de epilépsia. Atirou com o telefone ao chão, grita… eu não sei o que é que ela tem, nem sei o que fazer. Tenho de estar com ela. Não posso ir ao cinema. Compreendes?”

A partir daqui o livro é uma verdadeira viagem de nervos. Entre os personagens. Mas também entre o leitor e os personagens.  Dei comigo incapaz de compreender Juliette… e capaz de espancar Olivier. E uma “outra”, a V, caprichosa, irritante… como todas as “outras” que não têm nada a perder…

O drama continua…

“Como é que está a epiléptica? pergunta-lhe ela.

Olivier muda de expressão. -Não tem piada! É mesmo trágico!

– Ah, diz ela.

– Afinal ela é mesmo doente. Eu não sabia. Acabei de saber. Um dos seus amigos apareceu e contou-me.

-Pára. Estou-me nas tintas para ela. Só quero saber duas coisas: Um, queres deixar-nos? A mim e aos miúdos? 

-Não. Responde-lhe ele, rapidamente. -Não é isso que eu quero.

Ela não tenta disfarçar o seu alívio. Continua. -Bom, dois. Estás apaixonado por ela?

Ele hesita. Diz qualquer coisa que não é sim, nem não. Mas que termina por: É forte, sim.

– Merda, merda, merda! Suspira Juliette.”

Juliette que de início não quer saber nada, mas que depois quer saber tudo. Olivier que se faz de vítima. Incapaz de decidir o que quer. Incapaz de sair com a mesma incapacidade de ficar. V. que faz da vida dos dois um verdadeiro inferno.

“-Tu querias continuar esta estória e ao mesmo tempo ficar comigo? Não estou a dizer que sou capaz de o aceitar e à primeira vista parece que ela também não. mas se fosse possível. É isso que no fundo tu gostarias que acontecesse?

-Não. Antes, quando tu não sabias, sem dúvida que sim. Mas agora não!”

 

V procura o confronto. Uma noite encontram-se os três. Na casa dos dois.

– Há três semanas que adoptei a estratégia de sacos de areia mas não resulta. Terminar não é possível. Não faz sentido. As palavras têm um significado, querem dizer alguma coisa.

– Eu nunca te disse que queria deixar a minha mulher. Responde Olivier.

– Não. Não estamos a falar dela. Nós nunca falamos dela. Mas tu lembras-te quando nós falamos do que era ter uma aventura, que tu me disseste que entre nós não era apenas uma aventura?

– Talvez. Pode ser que eu tenha dito. É possível.

– E as últimas vezes que nos encontrámos. Tu tinhas ar contente.

– Sim.

Juliette fuma. 

– Então porquê? Pergunta-lhe V.

– Porque… responde Olivier.

– Porque o quê?

– Porque eu não me quero divorciar.

– E porque é que tu não te queres divorciar? insiste ela.

– Porque eu não quero esta tristeza. Porque quando acordo de manhã e olho para a Juliette não sinto desagrado como eu acho que devemos sentir quando queremos deixar alguém.

– Ainda me amas?

– Acabou.

O livro não tem propriamente um fim. Como na vida só há fim na morte… Há, no entanto, duas passagens que me apaziguaram com os personagens. Que me fizeram sentir que mesmo sendo diferente, todos os sentires são pertinentes.

Ele lançou-se nesta aventura com Vitória convencido de que falaria com a sua mulher e que ela o perdoaria. Como é que essa certeza poderia existir com a impressão de que Juliette o já não amava. Isso ele não sabia. Mas uma noite, ao entrar em casa, pouco tempo depois de lhe ter contado a sua aventura, Juliette olhou para ele sem dizer nada. Nos seus olhos ele viu duas coisas: a primeira, que Juliette o continuava a amar. E a segunda, que ela poderia deixar de o amar se ele a continuasse a trair. E sentiu-se morrer quando teve este pensamento. Desde esse dia a sua decisão estava tomada. Tudo o resto foi uma infelicidade. Uma tentativa desastrosa de sair desta história sem fazer muito mal a Vitória. Neste momento a única coisa que o preocupava era: não perder Juliette. Sem ela e sem os seus filhos. Sem a família. Ele não teria absolutamente nada.

Juliette saiu para a rua do Château-des-Rentiers perturbada. Durante os últimos meses ela tinha tido este sentimento inúmeras vezes.Ninguém compreendia a sua reacção à traição de Olivier, às suas mentiras, às agressões de V. O seu comportamento era incompreensível. Ela sentia-se humilhada pela compaixão dos outros. Sentiu as lágrimas humedecerem-lhe os olhos e, simultaneamente, a revolta a invadi-la. Porque as pessoas têm uma ideia muito precisa de como uma mulher traída se deve comportar, do que pode ou não pode suportar, do que ela pode ou não pode aceitar, e o consenso era, em nome da dignidade das mulheres, em nome da sua integridade, que ela tem o dever se mostrar intransigente, que deve preferir a solidão gloriosa a um amor imperfeito. Juliette , ela, lutou pelo seu direito ao seu amor imperfeito, ao seu amor conjugal, ao seu amor de merda como um dia disse V. Mesmo sabendo que na escala dos amores o seu se situava em baixo, mesmo em baixo, quase rente ao chão.”

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